A guerra não tem rosto de mulher

Título: A guerra não tem rosto de mulher
Autora: Svetlana Aleksiévitch
Editora: Companhia das Letras (cortesia)
Páginas: 392
Edição: 1
Lançamento: 2016
Sinopse: A história das guerras costuma ser contada sob o ponto de vista masculino: soldados e generais, algozes e libertadores. Trata-se, porém, de um equívoco e de uma injustiça. Se em muitos conflitos as mulheres ficaram na retaguarda, em outros estiveram na linha de frente.
É esse capítulo de bravura feminina que Svetlana Aleksiévitch reconstrói neste livro absolutamente apaixonante e forte. Quase um milhão de mulheres lutaram no Exército Vermelho durante a Segunda Guerra Mundial, mas a sua história nunca foi contada. Svetlana Alexiévitch deixa que as vozes dessas mulheres ressoem de forma angustiante e arrebatadora, em memórias que evocam frio, fome, violência sexual e a sombra onipresente da morte.
 Resenha

O ser humano é maior do que a guerra... – página 16

Engana-se quem pensa que somente homens lutaram na Segunda Guerra Mundial. E engana-se mais ainda quem acredita que os responsáveis pela derrota dos alemães e cia foram os estadunidenses. Neste livro, nós conhecemos histórias de dezenas de mulheres soviéticas (russas, ucranianas, lituanas, etc) que, com bravura e coragem, saíram de suas casas e entraram na guerra.

Elas não foram obrigadas a tal; primeiro todos os homens foram convocados (em alguns dos depoimentos as entrevistadas mencionam isso, como as vilas ficaram com mulheres e crianças apenas), mas, ao longo dos combates, mais e mais mulheres foram pedindo para participar da guerra, algumas com 14, 15 anos, outras com 20. É assustador ver que a maioria das mulheres tinham idades nessa faixa, e o pior é que não existia um lugar próprio para elas. As combatentes tinham que usar fardas e botas bem maiores que o tamanho que usavam, tinham os cabelos raspados, algumas com fios brancos sem nem terem alcançado os 20 anos de idade, e ainda lidavam com o fato de que suas menstruações demoravam para vir por conta do estresse, do medo e da adrenalina constante (e algumas nem vinham).

“Então ficou claro: faltavam homens, eles tinham caído em combate.... Ou foram feitos prisioneiros. Agora, éramos nós no lugar deles. ”  – página 71

Cozinheiras, lavadeiras, francoatiradoras, pilotas, médicas, cirurgiãs, tenentes, sargentos, enfermeiras.... Cada mulher exerceu um papel na guerra, mas todas elas tinham algo em comum: queriam lutar pelo país, pelo comunismo, queriam expulsar os alemães de seu território, e assim o fizeram. Mas o livro não trata apenas de coragem, ele mostra também a fragilidade destas mulheres, os momentos em que quase perderam suas vidas, o desejo que tinham de ganhar uma roupa intima feminina, paixões e amizades que se foram... São histórias tristes e cruas, verdadeiras.

Não sabíamos como era o mundo sem guerra, o mundo da guerra era o único que conhecíamos, e as pessoas da guerra eram as únicas que conhecíamos. Até agora não conheço outro mundo, outras pessoas. Por acaso existiram em algum momento? – página 10

Acredita-se que mais de um milhão de mulheres lutaram pela URSS durante a guerra, grande parte no front. O que eu mais gostei neste livro, foi ver o depoimento de tantas mulheres sobre coisas diferentes, sobre o amor, a dor, perda, angustia, medo, vaidade, sobre matar, sobre tudo. É interessante conhecer histórias assim, mas também é triste, é angustiante. Não dá para acreditar que certas coisas realmente aconteceram, que milhões de pessoas passaram por coisas tão horríveis, e que a maioria não conseguiu se curar.

“Na guerra, me esqueci de tudo. Da minha vida anterior. De tudo... Até do amor... “ – página 186


Algumas histórias contam como as mulheres ficaram depois da Vitória, quando a guerra acabou, e, dependendo da história, a gente até sente um certo alívio por saber que deu tudo certo para elas. Temos alguns finais felizes de mulheres que reencontraram seus maridos, filhos, pais, irmãos...  Mas algumas acabam sozinhas, traumatizadas, só aguardando a morte. E elas já viram muita morte. Algumas corriam em meio ao campo de batalha para resgatar feridos enquanto jorravam balas sobre suas cabeças, outras atiravam, algumas matavam, outras salvavam.

O combate terminou à noite. E de manhã caiu uma neve fresca. Sob ela, os mortos.... Muitos traziam as mãos erguidas para o alto.... Para o céu.... Pergunte para mim: o que é a felicidade? Eu responderei.... Talvez seja encontrar, entre os mortos, uma pessoa viva. – página 103

Este é, de longe, um dos livros mais lindos e tristes que eu já li na vida. Lindo porque, mesmo em meio à guerra, coisas belas ainda acontecem, como o companheirismo da parte dos soldados para com os outros soldados, o carinho com que as enfermeiras tratavam os que estavam prestes a morrer, a forma como as mulheres buscavam ser femininas num ambiente tão hostil e cruel. Triste por ser uma guerra, e, como tal, ter tanto sofrimento, tantas mortes. Os relatos são surpreendentes, alguns mais crus e fortes, outros mais sentimentais e beirando o divertimento. Mas todos são impactantes, de uma forma ou de outra.

A guerra não tem rosto de mulher é um dos livros mais reais e impactantes que eu li na vida, e eu faria a leitura novamente, pois é uma obra completa e com depoimentos incríveis, (alguns eu até li mais de duas vezes), e é o tipo de livro que todos deveriam ler, pois é a história do mundo contada através dos olhos femininos de quem estava lá, na linha de frente, no meio da batalha, lutando.

“Meu bem.... Não pode existir um coração para odiar e outro para amar. O ser humano só tem um, e eu sempre pensava em como salvar meu coração. Depois da guerra, passei muito tempo com medo do céu, até de levantar a cabeça para o céu. Tinha medo de ver terra arada. E as gralhas já estavam passando por ela tranquilamente. Os pássaros logo se esqueceram da guerra.”  – página 390



19 comentários

  1. Oi Dryh!
    Amei sua resenha! Não conhecia o livro e fiquei super interessada! Adorei a temática e o enredo, pois como vc disse, sempre vemos a guerra do ponto de vista masculino! Mas tem um livro que não é sobre a guerra, mas menciona os horrores dela, que é da escritora Jojo Moyes, a Garota que vc deixou para trás, conhece? Belíssimo!
    Dica anotada!
    Bj

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  2. Opa, segunda guerra mundial pela versão feminina e sem ser romantizada como vemos em outros livros? Nossa, que diferente né. Sempre vejo falarem bem desta autora e que seus livros são excelentes. Nunca li nada dela. Eu adoro livros lindos e tristes, mas os leio quando estou numa fase boa da minha vida, por que se não, vai ser uma choradeira só, hehe. Quero ler este!

    Bj, Van - Retrô Books
    http://balaiodelivros.blogspot.com.br/

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  3. Olá, mulheres participam e participaram de tudo o que se possa imaginar, só que os nomes delas raramente são citados, falados, lembrados, é como se não existíssemos além do papel de mãe. Muito bom saber que esse livro existe, farei o possível para lê-lo assim que puder.

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  4. Olá! Nossa! Nunca imaginei tal fato. Sim, que elas participam da guerra eu sabia, mas pensava que ficavam no suporte e não no front. Por que sempre que relatam algo sobre as guerras, sempre falam dos homens e nunca citam as mulheres. Gostei bastante da premissa e pretendo ler com toda certeza! Beijos!

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  5. Nossa, não sabia dessa coisa de mulheres lutarem como homens, na frente, tomando partido não. Já vi em filmes e tal,mas não tinha parado para ler documentários e nem nada a respeito. Achei o livro mega interessante e leria com certeza, essas mulheres sofreram pra caramba, senhor. Parabéns pela indicação de hoje, está aí um livro que deveria ser colocado nas indicações desse povo de livros sobre o empoderamento da mulher, mesmo sendo triste assim.

    bjs

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  6. Oiii
    Não conhecia o livro e essa incrível história.
    Apesar de triste gosto de ler livros sobre mulheres fortes, acho que necessitamos disso.
    Eu leria este livros com certeza e indicaria sempre também, acho uma leitura como essa necessária.
    Obrigada por apresentá -la a nós leitores
    Beijuh

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  7. Oiii Dryh, como vai/
    Menina eu fiquei completamente apaixonada por essa resenha e a história, gosto de livros trazem a mulher ao assunto principal, a tragam a nossa sociedade, como lutadora, isso a gente realmente ler, dica super anotada <3
    Beijinhos

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  8. Olá!

    Ainda não tive o prazer de ler nada da Svetlana (os preços não ajudam) mas não conhecia esse, mas já quero. Adoro livros com relatos reais, enriquecem muito a história. Parabéns pela resenha, conseguiu transmitir a mensagem da autora!

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  9. Caraca, Dryh! Como eu n sabia desse livro? Não só tem uma história incrível, como é baseado em fatos reais e tem toda uma carga história envolvida. Amo livros assim, eles tem muito mais a nos ensinar que qualquer fantasia ou terror...! E a sua resenha? Um texto impecável que nos faz ver os detalhes do livro sem forçar-nos a nada, apenas a ver c seus olhos. Funcionou! Já vou p lista! ;)

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  10. Oi Dryh. Parabéns pela sua resenha primorosa.
    Acredito que esse deve ser um livro impactante e até inspirador. Tenho vontade de le-lo, mas eu teria que estar num momento bem leve para tal, pois seria uma leitura bem densa.
    Filmes relacionados a guerras mexem muito comigo, tanto que muitos eu prefiro nem ver, com livros seria a mesma coisa. Mas com certeza esse é um livro enriquecedor.
    Beijo

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  11. Eu juro que não conhecia esse livro, muito menos a histórias dessas mulheres tão corajosas. Que leitura bela e triste deve ser. Sua resenha me tocou profundamente, e eu fiquei com muita vontade de ler os relatos. Eu adoro livros que retratam a guerra, então fiquei muito empolgada pela leitura.
    beijos
    www.apenasumvicio.com

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  12. Oi Dryh, sua linda, tudo bem?
    Eu leio muito sobre esse assunto, ele sempre é devastador. Já vi muitas mulheres na guerra como enfermeiras, como voluntárias, até como espiãs, mas no front, não sabia. Sempre me surpreendo, a cada história. Já teve a impressão de que nunca saberemos tudo o que aconteceu? Parece ser um livro incrível mesmo daquele que irá deixar marcas. Dica mais do que anotada. Sua resenha ficou ótima!!!
    beijinhos.
    cila.

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  13. Oi flor, tudo bem?
    Que livro interessante! Adicionando na minha lista agora.
    Eu adoro ler livros sobre a guerra ou algo relacionado. E gostaria de ler agora sobre essas mulheres soviéticas em busca da liberdade.
    Não conhecia esse livro, mas realmente me interessei pela leitura e vou procurar para ler sim. Obrigada mesmo pela dica ;)

    Beijos,
    www.leitorasempre.com

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  14. Dryyyyyyyhm to in love aqui! Amo livros sobre a segunda guerra e não conhecia esse ainda, mas já quero muito, muito, muito poder ler! Não fazia ideia de que tantas mulheres e tão novas tinham lutado nessa guerra não é uma informação que tenha muito destaque né. Adorei mesmo e to com muita vontade de ler essa história agora!

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  15. Oi Dryh, caramba que história fantástica a dessas mulheres que se assumiram totalmente patriotas se doando para o país. Eu não conhecia o livro e fiquei de boca aberta com sua resenha que traz a intensidade e dimensão desse livro com verdade nua crua, acontecimentos bons outros tristes.
    Parabéns pela belíssima e envolvente resenha, simplesmente adorei e quero ler este livro.

    Bjo
    Tânia Bueno

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  16. Um livro marcante, forte e que fará o leitor sentir muita emoção pelo visto, como eu raramente leio livros com essa pegada mais real, sobre guerras e afins, fiquei bem interessada, pois foge da minha zona de conforto e pelos pontos descritos na resenha, eu acredito que irei sim gostar, até tenho receio de ser uma leitura mais densa, mas assim mesmo, gostaria de conhecer, pois fiquei encantada com essa história tão forte e profunda sobre essas mulheres corajosas!

    Da Imaginação à Escrita

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  17. Oi!
    Estou louca para ler esse livro, mas na época do lançamento eu estava meio mal e achei que não seria uma boa ler um livro triste. Mas ainda quero ler, primeiro por se tratar de guerra e a historiadora em mim ama livros sobre guerras, e depois pq Svetlana Aleksiévitch ganhou um Nobel então imagino que sua escrita seja incrível.
    Bjs!

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  18. Oi Dry!
    Incrível a resenha, não sabia o que esperar da capa, mas pela sua resenha percebi que é uma leitura pesada, cheia de altos e baixos e muito real!!!
    Mesmo hoje formada nunca imaginei que na história da guerra tivesse existido cargos que femininos além de enfermagem, é realmente surpreendente saber que elas estavam em combate.

    Beijokas

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  19. Que ponto bacana de se ver a guerra, realmente os contos são sempre do lado masculino. As mulheres devem descrever de uma maneira muito diferente, que livro curioso.não conhecia mas me interessou até pque nunca fui muito adepta de livros de guerra e dos ultimos apaixonantes que li, me ampliou o horizonte e esse tema ficou entre os meus favoritos. Seria bacana tambem a leitura de uma esposa que tem que se virar para manter a familia enquanto o marido está lutando.

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Oiê! Muito obrigada por passar por aqui, deixe um recadinho com o link do seu blog e a gente dá uma passadinha lá mais tarde :)

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