Lançamento de setembro da Companhia das Letras, Pessoas normais traz a história de amor de Connell e Marianne, desde a época do ensino médio até os fins da faculdade, vários anos depois.
Autora: Sally Rooney
Editora: Companhia das Letras (cortesia)
Páginas: 264
Edição: 1
Lançamento: 2019
Sinopse: Na escola, no interior da Irlanda, Connell e Marianne fingem não se conhecer. Ele é a estrela do time de futebol, ela é solitária e preza por sua privacidade. Mas a mãe de Connell trabalha como empregada na casa dos pais de Marianne, e quando o garoto vai buscar a mãe depois do expediente, uma conexão estranha e indelével cresce entre os dois adolescentes – contudo, um deles está determinado a esconder a relação. Um ano depois, ambos estão na universidade, em Dublin. Marianne encontrou seu lugar em um novo mundo enquanto Connell fica à margem, tímido e inseguro. Ao longo dos anos da graduação, os dois permanecem próximos, como linhas que se encontram e separam conforme as oportunidades da vida. Porém, enquanto Marianne se embrenha em um espiral de autodestruição e Connell começa a duvidar do sentido de suas escolhas, eles precisam entender até que ponto estão dispostos a ir para salvar um ao outro. Uma história de amor entre duas pessoas que tentam ficar separadas, mas descobrem que isso pode ser mais difícil do que tinham imaginado.
Resenha
Connell é popular na escola: joga do time de futebol, tem amigos populares, é bonito e charmoso. Marianne não possui amigos e não tenta fazer: ela sempre fora uma pessoa solitária, e logo estaria na faculdade, onde poderia ser ela mesma e não precisaria aguentar o tipo de comentário que os amigos de Connell lhe dirigiam. Ainda assim, apesar destas diferenças, eles se gostam; a mãe de Connell trabalha para a família de Marianne, então passam muito tempo juntos, tempo este que aproveitam bastante. Contudo, fingem não se conhecerem na escola; Marianne não ligaria de conversar ou no mínimo cumprimentar Connell, mas ele não suporta a ideia de que seus amigos e toda a escola saiba que ele não só conversa com Marianne, como também mantém uma relação íntima com ela.
Com o passar do tempo, ambos acabam se mudando para uma faculdade em Dublin, onde as coisas mudam bastante. Longe dos amigos e da posição social que ostentava na época da escola, Connell se vê perdido em meio a tantas pessoas ricas que adoram se gabar sobre dinheiro e sentem-se superiores umas às outras, enquanto Marianne parece encontrar seu lugar no mundo, agora com vários amigos e até mesmo um namorado.
Estar sozinho com ela é como abrir uma porta para fora da vida normal e fechá-la depois de passar. Não se sente intimidado por Marianne; ela é, na verdade, uma pessoa bem descontraída, mas ele tem medo de ficar perto dela por causa do jeito confuso com que se vê agindo, as coisas que diz e que não diria normalmente. - página 13
É perceptível para nós, leitores, que Connell só consegue ser ele mesmo quando está perto de Marianne, mas no ensino médio não tinha maturidade o suficiente para admitir, preferiu perder o que tinha com ela a deixar que todos soubessem o que havia entre eles. A opinião alheia lhe era mais importante. A medida em que o tempo passa, porém, muitas outras coisas impedem que eles fiquem juntos, sendo a principal delas a falta de comunicação entre os dois. Como o livro dá saltos para o passado enquanto coisas acontecem no presente, é possível perceber que alguma briga ou desentendimento aconteceu porque houve uma má comunicação anterior, ou seja, Marianne e Connell não conseguiram expressar suas vontades e desejos, e assim acabam separados mais uma vez. Isso foi algo que me irritou em relação aos dois: poderiam ter estado juntos desde o INÍCIO, mas não conseguiam falar um com o outro, e acabavam infelizes por meses!
Seus olhos doíam e ele os fechou. Não conseguia entender como aquilo havia acontecido, como deixou a discussão lhe escapar desse jeito. Seria tarde demais para falar que queria ficar com ela, isso era claro, mas quando havia ficado tarde demais? Parecia ter acontecido imeditamente. - página 128
Além dos saltos temporais durante toda a história - que no começo me incomodaram um pouco, mas depois deixaram a narrativa mais interessante e envolvente - o livro também não possui divisão nas falas, o que me deixou bastante confusa no começo. Normalmente os autores escolhem entre travessão e aspas para iniciar e finalizar as falas das personagens, mas Sally não utilizou nenhum, os diálogos estão misturados à narração. Apesar de ser um pouco confuso, eu me acostumei logo e comecei a apreciar esse tipo de escrita, acredito que nunca me deparei com nada parecido antes.
CONTÉM SPOILERS A PARTIR DAQUI
Ao longo da história, Connell e Marianne passam por vários problemas e complicações, inclusive muitas emocionais; percebemos que ela não só sofre violência fisica e psicológica em casa (tanto pelo irmão quanto pela mãe, além de seu pai morto, provavelmente quem deu início às violências) como carrega as consequências disso: é uma mulher submissa que não consegue expressar suas vontades e levantar sua voz, está sempre procurando homens que a tratem como lixo, parece sentir prazer em ser humilhada e agredida, acha que não deveria existir, etc, enquanto Connell parece ter um complexo de inferioridade, sempre acreditando ser inferior às pessoas que o rodeiam, não se sente bem em Dublin, acredita não possuir um lugar no mundo e passa a sofrer de depressão.
Seria o mundo um lugar tão perverso a ponto de o amor ser indistinguível das formas das mais baixas e mais abusivas de violência? - página 198
Fica bem claro que Connell e Marianne se amam desde sempre, mas mesmo que a relação entre os dois seja a menos abusiva do livro todo, ainda acredito que não seja saudável, pois Marianne continua querendo ser submissa, e mesmo que tenha decidido abrir mão de Connell no final, para que ele fosse para NY estudar, continuo achando que ela deveria focar em si mesma, procurar ajuda para resolver suas questões e só quando tivesse algum amor próprio, aceitar que outra pessoa a amasse. Do contrário, ela continuará esperando Connell voltar para lhe dar um amor que nunca será suficiente, pois não há como suprir a ausência do amor próprio com o amor de outra pessoa.
Internamente, não sentia nada. Era como um congelado que tivesse degelado rápido demais ao ar livre e derretesse para todos os lados enquanto por dentro continuava duro. De um jeito ou de outro, exprimir mais emoção do que em qualquer outro momento de sua vida e, ao mesmo tempo sentia menos, sentia nada. - página 213
O livro é bom, não vou negar, mas deixou a desejar, principalmente o final. Pessoalmente, eu não gosto de finais abertos, e aqui me pareceu que o livro foi cortado na metade e a segunda delas se perdeu em algum lugar, não há um final, não há como saber o que vai acontecer; mas eu imagino que seja uma continuação do mesmo círculo vicioso desde o início: Connell vai estudar nos EUA e voltar com uma namorada, com a qual ele é feliz, mas não tanto a ponto de deixar de amar Marianne, e ela vai estar com mais um namorado abusivo que fará com ela o que quiser, enquanto ela continuará quieta aceitando tudo o que lhe derem, inclusive coisas ruins.
Nunca se achou digna de ser amada por alguém. Mas agora tem uma vida nova, da qual este é o primeiro momento, e mesmo depois de muitos anos se passarem, ela ainda vai pensar: Sim, foi aí o começo da minha vida. - página 48
Eu gostaria muito que uma continuação fosse lançada, e que nessa continuação Marianne não só descobrisse como amar e a crer em si mesma, mas também a não aceitar menos das outras pessoas. Durante toda a sua vida ela engoliu tudo o que lhe disseram, o bullying na escola e a violêcia em casa, que não para nem mesmo quando ela está na faculdade; seria incrível encontrar uma Marianne dona de si mesma, que reconhecesse seu valor e que conseguisse encontrar forças para se levantar do limbo em que se encontra. Porque ela está afundada em limbo, estando com Connell ou não.
Pessoas normais é um livro diferente de tudo o que já li, positiva e negativamente. Gostaria muito de dizer que os aspectos positivos conseguem ofuscar os negativos.
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